Bichos

Amélia tinha um outro ser que habitava o seu corpo além dela mesma. Não se tratava de um caso de possessão, e sim de um bichinho que morava dentro de seu peito. Toda vez que ficava triste ou com raiva, o bichinho acordava e começava a apertar as artérias que caíam dentro de seu coração. Mas bastava um banho quente, ou um encontro com amigos para que ele se acalmasse.

Mas um dia ele acordou e não quis mais ir dormir. Amélia tomou banho, comeu chocolate, lembrou de piadas infames - tudo para que o bicinho dormisse outra vez - mas nada adiantou. Ao fim do dia, ela foi deitar cansada e com aquele aperto dentro do peito. Teve sonhos bons, parece que a criatura adormeceu junto com ela. Mas foi só acordar e lá estava o bendito fazendo o maior auê.

Ela percebeu que sempre que ia fazer algo que não queria, o bichinho se agitava ainda mais. Era um mimado, e ela não sabia como domá-lo. Os apertões constantes que ele dava em seu coração não a deixava esquecê-lo. Tinha hora que parecia que ela não conseguia respirar. Foi no médico, e ele garantiu que ela tinha uma saúde excelente. Receitou um psicólogo. Pra quê, se Amélia não tinha desgostos? Amélia tinha era um bicho dentro dela que não ficava quieto por nada.
Decidiu ir no veterinário. Nada. No exorcista. Nada também. No psiquiatra. Este receitou um monte de remédios que Amélia se recusou a tomar. Não estava doente, ora bolas. Estava sofrendo de bicho dentro do peito.

E Amélia não achou solução. Atualmente é estudante de História, noiva, sonhadora e mesmo assim acorda com um aperto no peito todos os dias.